Tive conhecimento da história da Margarida através do artigo que escrevi para a plataforma Maria Capaz - "A Depressão Pós-Parto não é uma Miragem".
Assim que vi o seu comentário contactei-a para saber se poderia publicar a sua história no blog, nesta rubrica que cada vez mais nos descreve experiências reais e nos demonstra vivências, sentimentos e sensações que muitas mulheres e respetivas famílias sentem antes e/ou após o parto. - Histórias que dão a cara por esta causa.
Ao falar com a Margarida, encontrei uma (grande) mulher que ainda vivencia alguma dor, mas cheia de força para continuar a lutar, não só para ultrapassar por completo a depressão pós-parto que já há algum tempo enfrenta, como para divulgar a sua história na tentativa de ajudar outras mulheres e respetivas famílias que passem por um pós-parto semelhante.
Gostava de vos contar muito mais, mas sem dúvida que o tão claro, forte e genuíno testemunho da Margarida, espelha tudo o que vos acabei por dizer e muito mais!
Leiam, porque sem dúvida que, VALE A PENA!
Obrigada Margarida!
Obrigada a todas as mulheres que comigo têm partilhado as suas histórias, e que desta forma, têm contribuído para a divulgação de situações como estas, que se têm falado, e que se continuarão a falar muito por aqui.
Se também vocês querem dar voz à vossa história e força a esta problemática, enviem-me email para:
centro@mulherfilhaemae.pt
"Olá. Sou a Margarida e tenho depressão pós parto."
Podia ser a minha frase inicial na reunião de um grupo de mulheres que se junta em sessões semanais, tipo alcoólicos anónimos, para falar sobre o que lhes vai na alma quando chegam a este estado depressivo tão vulgar nos nossos dias, mas que ninguém sabe ao certo o que é, ninguém dá importância à coisa e todos pensam.." É das hormonas, coitada!"
As hormonas realmente ajudam a que tu chegues ao fundo de um abismo, mas não é o único motivo para atingires esta estado catastrófico de estado de espírito.
Com as outras não sei como foi. Não há grupos. Não se fala sobre isto. Ninguém gosta de admitir que está com uma depressão. Quanto mais admitir que está com uma depressão depois de ter um filho, que supostamente é uma coisa maravilhosa, espectacular.. a melhor coisa da vida, não é?
Eu amo ser mãe. Tenho dois filhos. O primeiro filho não tive nada. Fui uma mãe dita, normal.
Com a minha segunda filha tudo foi diferente. Tudo foi difícil.
Dizem que a gravidez me protegeu de tudo o que me estava a acontecer. O meu casamento acabou de um dia para o outro (literalmente) quando estava grávida de 7 meses.
Fui maltratada. Fui inferiorizada. Fui desprezada. Fui esquecida. Fui menosprezada. Fui enxovalhada. Fui posta de lado numa altura em que é suposto termos todo a apoio de quem está ao nosso lado. Tive apoio, mas foi do meu pai, da minha mãe e das minhas irmãs. Não contei a mais ninguém porque nunca quis acreditar que aquilo me estava a acontecer.
As hormonas da gravidez protegeram-me até ao dia em que a minha S. nasceu e o meu futuro ex me passou a mão pela cabeça e foi embora do hospital. Nem um beijo. Nem um "obrigado?". NADA.
Comecei a chorar e chorei noite e dia, 1 dia, 2 dias.. 3 semanas. Saí de casa, com os meus filhos e a nossa roupa. Voltei para a casa da minha mãe. Voltei a depender de ajuda de familiares. E descobri que ele tinha outra. E ele esqueceu-se que tinha filhos. E eu fiquei assim.
Após 3 noites sem dormir e valha-me a sorte de ter um pai médico, gritei por ajuda. Berrei por algo que nem sabia o quê. E ele fez o diagnóstico.
Depressão pós-parto.
Tinha chegado ao limite.
E ele chegou ao pé de mim com a minha primeira ajuda, anti-depressivos e calmantes.
Voltei a berrar que não chegava, precisava de mais. E ele voltou novamente ajudar-me e fui a um psicólogo que ainda hoje vou.
Eu estava no fundo. Os pensamentos em fugir e deixar os meus filhos com a minha mãe eram constantes. Queria morrer. Pensava em maneiras de tirar a minha vida e se teria coragem para rasgar os pulsos com a faca da cozinha. Perguntava-me se ao engolir a caixa toda de Xanax conseguiria fechar os olhos para sempre. Não sorria. Não brincava com os meus filhos, não lhes ligava nenhuma. Tentava encontrar soluções para despacha-los para longe de mim a toda a hora, a todo o minuto. Não me queria vestir. Não tinha fome. Não tinha sono. Só queria fugir de mim, da minha vida e de tudo e não conseguia aguentar mais. Vivi semanas à base de cafés e cigarros.
Após um mês e meio tinha perdido os 14 kg da gravidez e mais 7 kg meus. Cheguei aos 47kg. Estava cadavérica, triste, sozinha, com dois filhos e à beira de fazer 35 anos. "Quem me quer? Olha para mim, estou uma merda. Não valho nada. Fui trocada por uma merda é porque sou uma merda pior ainda". Sentia-me presa.
As pessoas em meu redor não compreendiam nada do que eu falava. Só ouvia "tens de viver para os teus filhos, eles são o mais importante, não és tu." e ".. tens de ser forte.." e eu só pensava.. "CALA-TE não consigo, não vês?? FODA-SE E EU?? Como posso ser para eles se nem consigo ser para mim??!!"
Gritava comigo. Chorava a meio da noite. Chorava em frente aos meus "amores maiores"
Estes foram os meus dias durante os primeiros 4 meses.
E tive de arregaçar as mangas e ir à luta. DE MIM. Dia após dia e mais outro dia, lutei e luto..
Hoje ainda vou ao psicólogo e estou sob os anti-depressivos. Deixei os calmantes à 15 dias, já não preciso deles. Quero estar com os meus filhos 24h por dia, mas não é todos os dias, ainda. Sorriu. Brinco. Durmo. Como. Vivo... mas tive de pedir ajuda a todos, batalhar para que compreendessem o que eu tinha. A minha doença. Trabalho com gosto outra vez e anseio pela hora de ir buscar os meus pirralhos á escola só para sentir o seu cheiro perto de mim. Já me olho ao espelho e vejo-o a Margarida, a batalhadora, a mulher bonita e extrovertida e amiga e divertida. Voltei a falar e tornei-me dona da minha vida como sempre fui.
Estou a voltar ao "de cima" e voltei a respirar. Mas ..
Tal só é possível se tu realmente quiseres VOLTAR."