Á conversa com a Ana #9 - "Gratidão."
Gratidão. É uma das emoções que mais tenho sentido ao longo do meu processo de cura. Todos os dias reconheço, no meu íntimo, que sou imensamente felizarda por tantas mãos que se estenderam, e que continuam a estender-se, para me ajudar.
Sempre me considerei uma pessoa independente. Eu e o meu marido gostamos de estar com os outros, mas também tínhamos um certo sentido de independência e proteção do nosso espaço. Do género, “quando a C. nascer não queremos muitas visitas, o pessoal a andar lá por casa. Queremos estar sozinhos, a curtir essa etapa tão importante das nossas vidas”. E fizemos isso. A C. nasceu e fechamos-nos ao mundo, acreditando que esse seria o passo mais natural a dar. Mas, no nosso caso, não foi.
Redescobri que somos muito Mais quando estamos em comunhão com todos os outros. Ninguém é verdadeiramente independente. Estamos agarrados uns aos outros. E isso é tão, mas tão maravilhoso! Por isso, só posso agradecer a todas as mãos que se estenderam.
Agradeço à minha médica de família que, dentro do que lhe foi possível, ouviu-me e acompanhou-me.
Agradeço à minha psiquiatra, a primeira mão decisiva que a vida estendeu-me. Obrigada pela empatia com que me ouviu e pela forma como organizou logo o meu plano de tratamento. Não me mostrou apenas que precisava de ser medicada, mostrou também que o tratamento para funcionar precisava do apoio dos outros. Mostrou que o caminho de cura não era sozinho, mas sim envolto de quem mais perto estava, no meu caso os pais, os sogros e o marido.
Agradeço à minha psicóloga. Durante todos estes meses, ajudou a acalmar a minha mente e o meu coração.
Agradeço aos meus amigos. Nunca senti que algum de vocês me estivesse a desamparar. Nunca senti críticas ou julgamentos. Pelo contrário, senti todo o vosso amor sempre que me ligavam ou mandavam sms. Tantas vezes eu não atendi mas vocês não desistiram. Respeitaram mas mostraram que estavam ali, se eu precisasse. Obrigada por todas as vezes que vocês atenderam as minhas chamadas e ouviram-me, por todas as vezes que se encontraram comigo para que eu saísse um pouco de casa.
Agradeço aos meus familiares. Obrigada por ligarem, por se disponibilizarem para ficar com a C. caso precisássemos descansar ou sair.
Agradeço às minhas duas terapeutas de Shiatsu. Que diferença fez poder incluir o Shiatsu no meu tratamento! O toque mágico do Shiatsu e as nossas conversas permitiram conectar-me de uma forma muito íntima (e terapêutica). Ajudaram-me a compreender a depressão com o coração. Ajudaram a arrumar, dentro de mim, a imensa culpa que sentia. Ajudaram a ligar o meu coração ao da C. Não me esqueço de uma das sessões, das primeiras, em que senti, durante a sessão, e a partir desta, um imenso amor por mim e pela C.
Agradeço aos meus sogros. As refeições, quentes, acabadas de cozinhar, que nos trouxeram, as vezes que ficaram com a C. para eu puder apanhar ar, as vezes que não dormiram, e ficaram com a C, para nós dormirmos, as vezes em que passei o dia em vossa casa, durante a semana, para não ficar sozinha com a C.
Agradeço à minha mãe. Tantas, mas tantas vezes estendeu-me as mãos. As refeições que nos preparou, a empregada que nos arranjou para limpar a casa (e que cá continua), as fraldas, leite, roupa para a C. que comprou, todas (e foram muitas) as vezes que ficou com a C. durante a noite para nós dormirmos. Chegou a sair de casa, perto da meia-noite, porque desesperados, cansados, já não tínhamos forças para acalmar e adormecer a C.
Agradeço ao médico que agora me acompanha, nesta fase de recuperação da minha forma física. Há poucos meses atrás estava em baixa forma. Hoje já corro 15 minutos, faço flexões, pranchas. O corpo ganha força, resistência e tônus muscular. A corrida é a minha meditação.
Agradeço à Ana, autora deste blogue. Sem ela eu não teria encontrado um espaço que me devolveu empatia, compaixão e compreensão. Obrigada pela tua coragem em partilhar a tua história e de criares um espaço (o único) que aborda este tipo de vivências. És uma pessoa muito especial, minha querida Ana.
E, deixo para o fim, o meu companheiro desta vida. A ele agradeço tudo. De ti já te conhecia a tua sensibilidade, a capacidade de te colocares no lugar do outro, a ternura, o sentido de partilha e entreajuda, a honestidade. Mas esta experiência mostrou-te ainda mais. Uma pessoa única, a que melhor me compreende e um pai excecional. Nunca me desamparaste, levaste-me no teu colo, embalaste-me.
Diz-se que é preciso uma aldeia para educar uma criança. Digo mais: é preciso uma aldeia para embalar uma criança, um pai e uma mãe. E eu tive (e continuo a ter) esta rede. Muito obrigada a todos.