Histórias que dão a cara por esta causa #16 - "ela veio para casa e não olhava sequer para o bebe"
Incrível a história que hoje vos trago.
Uma partilha robusta, clara, e bastante demonstrativa do quão a depressão pós-parto pode afetar a mulher, assim como a respetiva família.
Leiam e partilhem. Pois esta história passou-se na década de 80, assim como tenho a certeza que existirão muitas mais nessa época, ou previamente à mesma, que também poderão ser aqui partilhadas.
Contem-nos também a vossa história, e juntos, vamos reforçar a importância de se abordar com maior frequência e abrangência, esta problemática!
centro@mulherfilhaemae.pt
Boa tarde
Quero deixar a titulo póstumo à minha cunhada a sua pequena grande historia de depressão pós-parto, que hoje eu com 52 dois anos, sei que ela muito sofreu.
A minha cunhada viveu sozinha a primeira gravidez, longe dos pais, o meu irmão estava na tropa na Marinha e era eu com 14 anos na altura que dormia com ela e acompanhava nas consultas ao centro de saúde.
A relação dela com os meus pais não era a melhor, mas era tratada com respeito, mas sem o elo de ligação e sem o verdadeiro amor que ela necessitava.
Lembro-me no dia 30 de abril de 1978, a Zé, apareceu aflita a dizer a minha mãe que estava com sinais de parto, foi logo levada para o Hospital mais próximo cerca de 20 kilometros e ai foi deixada para dar à luz, sozinha, ainda era de manha a minha mãe veio para casa e esperamos algum tempo para telefonar ao hospital e saber noticias suas ( estava sozinha, num hospital que não conhecia sem qualquer apoio). Nessa tarde fui a rua e para espanto meu (14 anos) vi a Zé na rua com a sua mala e gritei para a minha mãe que ela estava ali o que se passava?
Sozinha e sem ninguém, fugiu, veio para casa, a minha mãe entrou em stress, chamou uma parteira local e nessa noite já dia 1 de Maio nasceu o meu primeiro sobrinho, saudável, lindo, só o pude ver na manha seguinte, fui eu que o pesei, que o vesti e fiquei lá em casa para ajudar a Zé, acho sem sombra de duvida que fui o seu principal apoio naquela altura, lembro-me que ela dormia e eu cuidava do bebe, ainda assim como miúda que era sentia-me responsável pelo meu sobrinho que amo incondicionalmente.
Notei e lembro-me uma ou outra vez que ela estava distante e que me agradecia por tratar do filho.
Passaram alguns anos, casei com 21 anos e tive a minha filha, correu tudo bem comigo e com ela, a minha mãe ajudou-me muito no inicio fui trabalhar ao fim de duas semanas do parto (nesse tempo não havia licenças) e tudo foi correndo bem.
Um ano depois estava de novo a Zé grávida, a minha bebe tinha um ano e ia nascer mais um sobrinho para mim, aconteceu que no dia em que a Zé soube que ia ter outro menino ficou em agonia, porque soubemos mais tarde queria uma menina como a minha.
O meu segundo sobrinho nasceu em Junho de 1988, nessa altura o meu irmão acompanhou a Zé ao Hospital de Beja onde o segundo filho nasceu, mas tudo começou a correr mal quando ela não quis ver o próprio filho e teve atos de violência para com o meu irmão e os próprios pais dela.
Soube imediatamente que havia um problema que se tinha instalado, o bebe veio para a minha casa, cuidei dele e da minha filha com a ajuda preciosa da minha mãe, quando quisemos ir procurar as roupas para o bebe não havia nada, tivemos que pedir e comprar, foram meses difíceis, ela veio para casa e não olhava sequer para o bebe, tinha alucinações, e foi internada para tratamento psicológico, estava com uma forte depressão que já estava instalada há muito tempo.
Temo que o seu historial de vida era complicado, julgo que havia uma falha grave no seu sistema nervoso o que se veio a concluir quando com 53 anos foi vitima de cancro e desde o primeiro dia se rendeu à doença até ao dia em que faleceu.
Hoje esse meu primeiro sobrinho é pai de uma menina e por muito que me custe admitir, sei que ele a ama, mas não consegue demonstrar, separou-se da mãe da filha e é muito distante dela. (FATALIDADE? GENES?) tento perceber………..
Obrigada por me darem esta oportunidade de contar e de certo modo aliviar-me a mim própria, penso muitas vezes se podia ter feito mais por ela nessa altura mas fiz o que pude e na doença estive a seu lado até ao momento da sua morte.
Ah já agora, vou ser AVÓ.
Beijos
Maria